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quinta-feira, 23 de junho de 2011

MOTEL

Na evolução da casa de tolerância, assim chamado o local de amores escusos, o motel constitui o ponto alto nos dias correntes. Começou-se com o cabaré ou pensão, veio o rendez-vous, depois inaugurou-se a buate (com U mesmo, meu inteligente revisor) e atingiu-se a idade de ouro, o motel, a respeito do que escrevi, no livro que me deu muito trabalho - "Anglo-norteamericanismos no português do Brasil", editado no Rio no ano passado: "Quem percorre as estradas norte-americanas, de vez em quando lê placas indicativas de MOTEL, palavra que hoje se vai internacionalizando. É criação dos Estados Unidos, onde significa hotel para automobilistas, hotel à beira de estrada (Motorist's Hotel). No Brasil vigora a pronúncia oxítona, isto é, a “tonicidade recai na última sílaba tel. Note-se que o plural inglês é Motels, mas no português deve fazer-se o plural Motéis, de acordo com a regra". Motel está assim constituído da primeira sílaba de motorista e da última de hotel, uma hospedaria para motorista nas estradas, depois de cansativa viagem na monotonia dos compridos caminhos asfaltados. Lugar de repouso desses choferes amados das mulheres, da mesma forma que amadas delas são os soldados de polícia e trapezistas de circo. Nos dias atuais outros tipos conquistam as garotas, desta vez da alta-roda: o bandido, o assaltante, o vendedor de droga. Mas o guiador de caminhão e de carreta deu passo à frente: arrecadava quengas nos percursos sem-fim e as levava para os motéis, e com elas agüentava noite de sexo. Daí, pouco a pouco, motel passou a casa de tolerância, e por este modo invadiu as grandes cidades, os centros populacionais graúdos em todo o Brasil - e hoje motel vale a última moda em casa de tolerância neste desastroso século XX. Um luxo.

Apartamentos de marajá indiano, espelhos nas paredes, no tecto, serviços de bebidas e refeição, filmes sexuais escabrosos, e na saída o casal recebe presentinhos de sabonete e pentes de propaganda. Depois do motel, que vai aprender? Automóvel equipado com a macia cama já enfeita a paisagem. Falta agora ou está chegando a última fase da evolução: ruas e praças, de dia e de noite, em leitos, banco ou  grama de praça.


A. Tito Filho, 20/11/1987, Jornal O Dia

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